sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Pitadas de insônia

Maravilha... Duas e meia da manhã e uma chuva como eu nunca vi antes por aqui - talvez uma sobra desses tornados recém-inventados lá do Sul - me acorda e me tira o sono. Não, não foi bem assim...

Vamos reformular: duas e meia da manhã e eu acordei e perdi o sono. A chuva caiu incrivelmente forte e me fez deparar com alguns problemas da minha casa, daqueles que só surgem quando a chuva cai incrivelmente forte. Mas, se foi a chuva que me acordou, não foi ela que me fez perder o sono: ela só completou o serviço.

Na verdade o sono já tinha ido embora de um corpo que, às dez, quando eu terminei minha última aula, sentia-se extremamente cansado. Mas, pra falar a verdade, cansaço e sono não são mais, já há algum tempo, palavras que possam expressar alguma sinonímia. O cansaço tem sido algo mais presente. O sono tem sido resultado de algum torpor alcoólico ou de raros momentos de satisfação que, de qualquer forma, embriagam.

O pior é pensar no significado disso... Pensar que cada vez mais os momentos de satisfação estão, de alguma forma, associados ao torpor alcoólico. Que a cara limpa dificilmente permite esses momentos, já que ela abre espaços demais no cérebro pra que outros pensamentos - nada satisfatórios - se imiscuam, sorrateiros ou nem tanto.

De repente os cafofos são lugares - especialmente quando moram dentro de nós - onde não se dorme sóbrio. A sobriedade, se acordamos no meio da noite, revela casas grandes e cheias de pequenos, mas desgastantes problemas, nos rouba o acolhimento do cafofo e nos tira o sono.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O velho diário

É interessante encontrar este lugar intocado, depois de quase um ano, como o "velho diário perdido na areia" da música do Vander Lee. Aliás, chega a ser estranho descobrir que já faz mais de um ano - ou que só faz um ano - que eu saí daquele cafofo...

Afinal, tanta coisa aconteceu, tanta coisa mudou, que eu acho que vivenciei algo que eu só conhecia na teoria da História: o distanciamento entre espaço de experiência e horizonte de expectativa. Por tudo que rolava comigo naquele 19 de outubro, nada podia me fazer imaginar como seria o 19 de janeiro seguinte, por exemplo, ou como poderia ser este quase 29 de setembro. Por outro lado, essa sensação de aceleração ainda faz aquele tempo me parecer muito próximo...

Na verdade, um pouco próximo demais. Quase todos os laços que me ligavam ao que eu era em outubro de 2008 foram quebrados. Alguns por mim e outros (os mais doloridos) à minha revelia. Sei que isso deveria representar um alívio na pressão sobre as paredes do cafofo mas, ao que tudo indica, não é bem assim que as coisas acontecem. Na verdade, laços quebrados deixam cacos, e, num cafofo, esses cacos não são jogados fora, apenas varridos para baixo do tapete.

Talvez por isso mesmo eu acabe, quase um ano depois, voltando aqui. Se o velho diário estava perdido na areia, eu pelo menos marquei o lugar onde o enterrei. De vez em quando ele pode ser útil, caso algumas mágoas precisem ser também enterradas.

domingo, 19 de outubro de 2008

Cafofos dentro de nós

Como eu escrevi outro dia, o cafofo não é o lugar onde a gente mora, é um lugar que mora dentro de nós. Um lugar que me lembra a garagem do meu avô, onde a gente guarda um monte de coisas que a gente só entende porque guardou quando sente falta delas.

Esse meu cafofo está incrivelmente lotado... tão entupido de coisas que faz todo o resto parecer vazio. Guardei lá sonhos, planos, expectativas. Guardei um projeto de vida que era pra ser vivida à dois, no qual realizações, alegrias, tristezas seriam compartilhadas. Guardei um amor imenso, tão grande que eu não sabia direito nem como lidar com ele.

Com tudo isso empilhado no cafofo, não sobrou quase nada aqui fora. Aliás, sobrou sim... Uma enorme tristeza que eu não consegui trancar lá dentro, e que contagia cada coisa que eu faço. Não estou mais fazendo aquilo que, no post passado, eu disse que estava. Até mesmo porque cada uma daquelas atitudes só fazia a tristeza crescer... Estou me cuidando, tentando colocar coisas positivas na minha vida, tentando me ocupar pra ver se eu ocupo o espaço dessa tristeza e ela se toca e vai embora.

Gente, falando sério... eu nunca imaginei que se pudesse sentir tanta falta de alguém, assim...

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

O que eu ando fazendo...

Ando fazendo tudo que qualquer médico desaconselharia a um cara de quase 45. Bebendo demais, todo dia... e fumando demais também. Ainda mais depois de hoje, quando ouvi no rádio (outra coisa que ando fazendo demais) que trocentos por cento da nossa possibilidade de ter um enfarto vem da carga genética... E afinal, mamãe se foi com 42.

Ando sonhando demais. Não aqueles sonhos que a gente sonha dormindo, porque estes geralmente têm baratas. Sonhando acordado com coisas que eu deveria ter sonhado quando eu era bem mais novo e bem menos contaminado. Sonhando com carreiras acadêmicas e cátedras só porque eu consegui, depois de 42 anos, me formar, e depois de um ano e meio terminar um mestrado.

Ando conhecendo gente feia e lugares feios demais. Isso me preocupa mais do que as outras coisas. Significa que eu ando me violentando pra me tornar agradável ou sociável. E tenho visto muito mais feiúra do que beleza nos lugares e nas pessoas. O que pode significar três coisas: que o meu nível anda baixando terrivelmente, que eu prefiro beber para esquecer o lugar onde estou, ou que eu não consigo mais enxergar a beleza na feiúra. Nenhuma das três alternativas é nada agradável.

Ando gastando dinheiro demais... o que também é um mau sintoma. A gente sempre espera tirar do bolso aquilo que não consegue tirar da vida.

Resumindo... ando esquecendo de mim. Ando me privando de tudo que poderia ser meu em prol de um "outro" idílico e idealizado, que talvez exista só em sonhos (daqueles sem baratas), e que eu insisto em dizer que eu conheci.

Eu ando fazendo a coisa errada, né? Agora, por exemplo, eu deveria estar dormindo.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Saindo fora... e fechando a porta atrás de mim.

Eis que se passaram dois meses desde que Virgínia, Priscila e Suzane entraram no Cafofo... e nenhum de nós quatro está mais lá. Aquele cafofo está mais vazio do que nunca e, de mim, lá só ficou a persiana, o box do banheiro e o armário da pia... que eu espero que sejam úteis para o próximo ocupante. Certamente vieram comigo algumas lembranças, também... Lembranças de taças de vinho, noites de prazer e planos inconclusos. Mas as lembranças dominantes - depressão, pranto, falta de perspectivas - eu fiz questão de deixar por lá quando eu saí. Espero que não grudem nas paredes como velhos fantasmas e se dissipem na primeira faxina.

Se a pequenez do Cafofo me oprimia, a amplidão da minha casa, ao contrário, amplia meus horizontes. Descobri que é muito mais fácil se sentir só quando se dispõe de quatro paredes apenas, do que quando se tem vários cômodos, múltiplos cafofos entre os quais transitar. Isso deve ser coisa de quem já passou dos 40: sente-se falta de uma certa dignidade, não é mesmo? Que, com essa dignidade, venham novos planos e, quem sabe, que alguns deles dêem certo

Pensei até em encerrar este blog. Mas não... Acaba que, no fundo, o verdadeiro Cafofo não é simplesmente o lugar onde a gente mora, mas o lugar que mora dentro da gente. E aqui eu escrevo coisas que eu não escrevo em outros lugares. Coisas que falam do cafofo dentro de mim e que precisam ser externadas. Portanto, vou deixar uma imagem do velho Cafofo que eu acho que representa bem o que vem de agora em diante. Uma foto que eu tirei da janela, no meu último dia lá... Novos horizontes!



sexta-feira, 4 de julho de 2008

Virgínia, Suzane e Priscila

Hoje a solidão do Cafofo está preenchida de uma forma que eu não tinha imaginado. Sabe aquelas idéias que você tem e não sabe muito bem por quê?... Às vezes elas dão certo.

Virgínia chegou aqui ontem. Acho que foi paixão à primeira vista. Não acreditava muito no que podia acontecer, mas no momento que ela entrou aqui, tudo se encheu de vida... De repente eu tinha vontade de conversar, de colocar umas músicas bonitas pra ela ouvir. Pensei até em tocar violão pra ela, e talvez eu faça isso hoje.

O problema é que, onde eu conheci a Virgínia, a Priscila também tinha chamado a minha atenção. Na verdade, ela era mais vistosa, talvez até um pouco perua. Mas tinha um certo ar de solidão que me atraiu. Virgínia é mais "pé-no chão". Mas Priscila, me olhando de cima para baixo, parecia dizer "me leva que eu te domino com a minha beleza... sei que você tem um lugar para mim".

Não resisti... Priscila está aqui em casa, agora.

Mas aí veio outro problema... Números pares são sempre complicados. Não gosto muito deles. Meus anos pares, por exemplo, nunca me trouxeram boas recordações. E, quando eu fui buscar a Priscila, meu olhar necessariamente se desviou para outras tantas moças bonitas... e eu a vi. Ali, escondidinha em um canto. Era a Suzane. Pequena, nada exuberante, mas com aquele jeito aconchegante que sempre cabe ao seu lado, em sua cama... se é que eu me faço entender. E ela veio pra cá, também.

Agradeço a elas por me fazerem descobrir que, na pequenez do Cafofo, há espaço para outros seres vivos. E que elas ocupam esse espaço de forma maravilhosa, trazendo beleza e alegria, mesmo eu tendo pagado por elas...

Virgínia, Priscila e Suzane. Minhas três plantas.

terça-feira, 24 de junho de 2008

O útil e o fútil

Ainda ontem (ou foi hoje de madrugada?) eu estava escrevendo aqui sobre essa coisa de ser útil... É interessante. Estive pensando melhor sobre isso e cheguei à conclusão que o interessante não é ser inútil, mas sim ser fútil. Não fútil como qualidade intrínseca da pessoa, ou seja, apenas se importar com futilidades, mas fútil como um objeto que se possui apenas por prazer.

Afinal, o que é uma coisa útil? É algo que serve a um determinado propósito, mas que você não dá nenhuma importância especial. Algo que é descartável por natureza. E algo do que as pessoas só sentem falta se precisam dele para fazer alguma coisa. Um saca-rolhas é útil. Mas ninguém sente falta de um, a não ser que tenha uma garrafa de vinho para abrir.

E, o que é pior!... Coisas úteis são facilmente substituíveis. Mesmo que você tenha uma garrafa de vinho para abrir e não tenha um saca-rolhas, haverão outros métodos (mesmo que mais trabalhosos) para abri-la. Útil é aquilo que diminui o seu trabalho. Uma faca cega e impossível de amolar, por exemplo, aumenta o seu trabalho. Seu único destino é o lixo.

Agora... uma coisa fútil é completamente diferente! Sua única razão de ser é dar prazer, e esse prazer não está, de forma alguma, associado à sua serventia. Por isso costumamos preservar indefinidamente nossas coisas fúteis. O precisar associado a algo fútil é completamente diferente do precisar associado a algo útil. É algo visceral, que vem de dentro, que nos completa. Ficamos felizes cada vez que obtemos alguma coisa fútil, porque ela vem ao encontro dos nossos desejos. Ninguém fica feliz ao comprar uma escova de dentes ou um rolo de papel higiênico.

Fútil começa com F... F de felicidade, de festa, de farra, de foda. Útil começa com U de uniforme. Nossas coisas fúteis ficam expostas, iluminadas. Temos prazer em exibi-las. Aquilo que é útil fica guardado em gavetas; só vê a luz por breves instantes e depois retorna ao escuro que permeia a utilidade.