Não... Não tem quinze dias que eu não escrevo aqui. Na verdade, tem quinze dias que eu começo a escrever e não termino, e fica tudo esquecido como um "rascunho" que, na verdade, nunca será terminado. Afinal, escrever alguma coisa, ainda mais que tenha a ver diretamente com a gente, é sempre algo "pá-pum!". Ou sai na hora ou não sai.
Mas fins de fins-de-semana são sempre uma boa possibilidade de pintar um "pá-pum!". As noites de domingo, ao menos para mim, sempre foram um bom momento pra olhar pra trás e ver tudo aquilo que não é. Tudo aquilo que poderia ter sido. Tudo aquilo que nunca vai ser. Ou, pior ainda, tudo aquilo que já foi e não será de novo.
Noites de domingo são sempre muito diferentes dos "dias de domingo" do Tim Maia. Ao contrário de todas aquelas cenas idílicas da música, a única "voz do coração" que fala nas noites de domingo é uma voz cansada, que nunca "fez de conta que ainda é cedo". Pelo contrário, ela sempre acha que já é tarde demais...
Não existe salvação nas noites de domingo. Mesmo para os crentes e devotos, toda esperança de redenção se exauriu há algumas horas atrás, quando o padre disse amém e os sentenciou a que fossem em paz e que o Senhor os acompanhasse. Na verdade, porém, o que acontece é que o Diabo nos carrega, e vamos curtir a ressaca de fim de domingo, sejamos religiosos ou não. Fico imaginando se o padre também sente isso ou, já que pra ele todo dia é domingo, basta tomar mais uma taça de um bom vinho, sem a obrigação de transformá-lo em sangue....
Domingos têm algo de definitivo... É ao fim dos domingos que temos a nítida percepção que pretendemos, na semana que se inicia, fazer um monte de coisas que não faremos. Seremos mais magros, mais corretos, mais pontuais, levaremos uma série de coisas mais a sério e levaremos a vida bem menos a sério. Teremos amores, aventuras, prazeres. Seremos pessoas novas depois do domingo. E, ao mesmo tempo, nos bate a certeza absoluta que seremos a mesma merda.
Um bom domingo nos leva a pensar no nosso verdadeiro lugar no mundo. Com sorte, nosso time ganhará o jogo, um brasileiro será vitorioso na Fórmula 1, nossas crianças não encherão muito o saco. E, no fim da noite, pensaremos que foi o time que ganhou, que foi outro brasileiro que ganhou, e não nós. Quando muito, alguns terão o consolo de saber que as crianças enchem o saco por quererem sua companhia, não sua conta bancária.
Fico aqui pensando há quanto tempo os meus domingos têm sido iguais, e não por causa da segunda-feira que se aproxima. O quanto eles me têm feito cair na real. Passar um final de semana em pleno gozo da minha função familiar e paterna, entre ping-pongs, parques de diversões, vestibular de filho e filmes no DVD. Acordar cedo e fazer o café, e de repente um cachorro-quente pra estragar as crianças logo de manhã. Comprar o frango e fazer o "macarrão do papai" com molho branco...
Aí olhar pra trás e ver que não rola mais o "ninho de gente" assistindo filme no sábado à noite. Afinal, as costas doem... Que as tristezas acumuladas ao longo dos anos nunca vão se transformar em alegrias. Que tudo aquilo de parques, vestibulares, filmes e cachorros-quentes é ilusório e se desfaz com a mesma facilidade que uma mensagem qualquer é postada num "site de relacionamentos" qualquer.
Afinal, os domingos nos mostram que toda aquela nossa suposta realidade, aquilo que acreditamos ser real - filhos, ping-pongs, macarrões - são meras quimeras onde escondemos aquilo que poderíamos ser. Nossa verdade, em cada domingo, está escrita apenas nos lugares onde nos situamos indefesos e indefensáveis.
Talvez essa seja a grande verdade dos domingos: somos obrigados a encarar que não somos aquilo que pensamos de nós. Nosso lugar no mundo não é feito de algum agradável aroma de rosas que damos ou recebemos, mas do fedor de esgoto com que deparamos quando abrimos a porta do Cafofo. Não somos aquilo que pensamos que somos. Somos aquilo que, miseravelmente, pensam de nós, não importa o que façamos.